Procurai bem, portanto, evitar crer, como os devotos orgulhosos e cheios de si, que vossas cruzes são grandes, que são provas de vossa fidelidade e testemunhas de um singular amor de Deus para convosco. Esta armadilha do orgulho espiritual é muito sutil e delicada, mas cheia de veneno. Deveis crer:
1) que vosso orgulho e moleza vos levam a considerar palhas como se fossem traves; picadas como se fossem chagas, um rato como se fosse um elefante; e uma palavrinha no ar, - um nada, na verdade, - como se fosse uma injúria atroz e um cruel abandono;
2) que as cruzes que Deus vos envia são antes castigos amorosos de vossos pecados, - e de fato o são, - que sinais de especial benevolência;
3) que, seja qual for a cruz que Ele vos enviar, ainda assim vos poupa infinitamente, em virtude do número e da enormidade dos vossos crimes, que só deveis considerar à luz da santidade de Deus, que nada de impuro tolera e que atacastes; à luz de um Deus moribundo e aniquilado de dor, por causa de vosso pecado, e à luz de um inferno sem fim, que merecestes mil vezes e talvez cem mil;
4) que na paciência com que sofreis há muito mais de humano e natural do que o julgais: provam-no as pequenas mitigações; as procuras secretas de consolação; as aberturas de coração, - tão naturais, - a vossos amigos e, talvez, ao vosso diretor; as desculpas tão finas e prontas; as queixas, ou melhor, as maledicências tão bem urdidas e tão caridosamente expressas, contra os que vos fizeram algum mal; as referências e complacências delicadas para com vossos males; a crença de Lúcifer de que sois algo de grande, etc. Nunca terminaria se me fosse necessário descrever as voltas e reviravoltas da natureza, mesmo nos sofrimentos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário